Ricardo Meier

Comenta o mercado de vendas de automóveis e tendências sustentáveis

Um ano depois de fechar fábricas, Ford vira marca 'nanica' no Brasil

Montadora norte-americana vendeu menos de 38 mil veículos em 2021 contra 139 mil dois anos atrás, quando ainda produzia o Ka e o EcoSport no país

Nesta terça-feira, 11, completou-se um ano desde que a Ford anunciou de forma surpreendente o encerramento da produção de veículos no Brasil. Embora a empresa já desse sinais de problemas há tempos, inclusive com a venda das instalações em São Bernardo do Campo, a notícia causou comoção e perplexidade.

Uma das maiores montadoras do mundo, com presença global e longa história no país, a Ford ainda era a 5ª marca mais vendida do país, com uma enorme base de clientes espalhada por todos os cantos.

Nada disso, no entanto, bastou para que a cúpula da empresa evitasse o caos para proprietários, funcionários, parceiros, fornecedores e rede de concessionários. O saldo, após 12 meses, é devastador.

Além de gastar bilhões em indenizações e acordos, a Ford viu sua participação no mercado brasileiro encolher como nunca se imaginou. Em 2021, foram vendidos 37,8 mil veículos, uma queda de 73% em relação a 2020, ano que já apresentava um recuo significativo nos emplacamentos.

Graças a isso, a Ford obteve apenas a 11ª posição no ranking de vendas, muito em função do estoque de modelos Ka e EcoSport que já haviam sido produzidos. Somados, os modelos nacionais representaram 35% de tudo que ela vendeu no ano passado.

O sobe-e-desce dos emplacamentos dos modelos da Ford entre 2020 e 2021
O sobe-e-desce dos emplacamentos dos modelos da Ford entre 2020 e 2021
Imagem: AUTOO

Ou seja, sem eles a marca teve 24,4 mil emplacamentos, volume que a faria terminar o ano em 12º lugar, atrás da Peugeot e levemente à frente da Citroën.

O cenário pós-apocalipse tem sido relevado pelos executivos da Ford, que não cansam de afirmar que o Brasil continua um mercado importante e que a fabricante busca uma operação saudável, ao contrário das duas últimas décadas, de grandes prejuízos.

Mas as perspectivas continuam bastante confusas. Assim como várias outras marcas, a Ford quer ser ‘premium’, ou seja, vender carros de alto valor agregado e que têm margem de lucro mais elevada. No entanto, essa estratégia exige um portfólio bem organizado e distribuído, coisa que ela não tem e talvez não consiga tão cedo.

Esperança na picape Maverick

Após tirar de cena seus carros de entrada e fechar a linha de montagem de modelos médios na Argentina, sobrou à marca apenas um veículo de volume, a picape Ranger. A ironia é que ela, dona de mais da metade dos emplacamentos de 2021, vive em função das vendas no Brasil, mesmo sendo montada no país vizinho.

Os demais modelos que sobreviveram no portfólio têm uma presença pífia, seja o SUV ‘retrô’ Bronco Sport ou o chinês Territory – o esportivo Mustang apenas enfeita concessionárias, sem qualquer peso nas vendas.

Para 2022, a Ford promete lançamentos importantes como a picape Maverick, uma rival da Fiat Toro, mas com conceito um pouco diferente. Fabricada no México como o Bronco, ela dificilmente terá condições de disputar esse segmento tão aquecido, por conta do foco no mercado norte-americano.

Em outras palavras, ela custará caro, assim como o SUV, limitando seu potencial a clientes endinheirados e fãs da marca. É aí, inclusive, que reside um dos problemas da Ford, a falta de conexão entre seus novos veículos.

Ford Maverick 2022
A inédita picape Maverick chega no começo do ano, mas pode não ter volume suficiente para fazer diferença nas vendas
Imagem: Divulgação

Basta olhar para a gama da BMW, marca premium líder no Brasil, para entender que ela oferece opções diversas, mesmo que a mais acessível custe quase R$ 290 mil. Mas pode-se evoluir em várias direções a partir de um X1, Série 3 ou Série 1.

Na Ford, o modelo mais barato hoje é justamente a Ranger, por pouco mais de R$ 200 mil, e que logo dará lugar a uma nova geração, certamente mais cara. Acima dela vem o Territory, um SUV que pouco tem a ver com o DNA da fabricante, por R$ 220 mil, e em seguida o Bronco Sport, já acima de R$ 270 mil. Enquanto o primeiro teve 2,2 mil emplacamentos, o segundo acumulou apenas mil unidades vendidas em oito meses.

Fica a curiosidade de entender onde a Maverick caberá nesse meio, mas não será surpresa se ela custar mais que irmã maior Ranger.

Por enquanto, tudo indica que a Ford terá uma presença bastante discreta no Brasil nos próximos anos, com alguns produtos com alguma relevância, mas que não permitirão à matriz sonhar com grandes números de faturamento. Ao menos algum lucro pode surgir daí, se é que ele compensará tamanho dano à sua imagem.

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